Movimentos antirracistas

Como quebrar paradigmas do racismo é tema no Afro Presença

Desde os primórdios da mídia, produções culturais estão contaminadas com retratos de racismo. Na televisão, na publicidade, no cinema, a prática da exposição vulnerável e a situação imposta por paradigmas em nossa sociedade contribuem para a criação de estereótipos. E é sobre isso que a Afro Presença conversou no último primeiro de outubro.

O eventou contou com a presença de grandes nomes da televisão como Hélio de La Penã, Val Perré, Jonathan Haagensen, o publicitário Felipe Silva e a jornalista e criadora da Afrogooglers no Google Brasil, Christiane Pinto. O debate evidenciou a importância da presença de pessoas negras na criação, produção e edição midiática para retratar melhor a figura do homem e mulher negra no país. 

Felipe Silva que trabalha há 15 anos na empresa de publicidade Y&G, diz que demorou muito para encontrar pessoas negras no seu ambiente de trabalho, embora afirme que o espaço apresenta muita diversidade: “A publicidade vai muito além, está por trás de toda criação”. Ele cita a importância da diversidade para as televisões em um país em que 56,2% se autodeclaram pardos ou negros, de acordo com o IBGE.  

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Jonathan Haagensen participante do projeto “Nós do Morro”, nascido e criado na periferia do Rio de Janeiro, defende a democratização de espaços e denuncia o atual racismo: “A história do entretenimento foi apenas um lado branco”. O ator defende a necessidade do papel negro na mídia para modificar a perspectiva atual, que é percebida “a partir do ponto de vista do homem branco”. Adquirir a consciência do racismo e da importância do tema da diversidade o fez recusar alguns projetos  que estereotipavam o negro.

O Ator Val Perré entra em cena e se mostra desapontado com o que vivencia: “Não há um lugar confortável ainda, pois tudo o que fazemos no cinema reflete e o que temos na sociedade”. O ator faz uma comparação ao impacto que a televisão e o cinema causam, sendo “fixantes para o telespectador”. 

Ele diz que “o que impede o protagonismo negro são vários fatores, desde a sociedade racista até a publicidade” e relembra casos em que a representatividade negra na TV foi alvo de críticas negativas, citando o caso do padre negro de Roque Santeiro na década de 70 ter sido alvo de reclamações, ressaltando que isso não parou.

O ator e participante do programa Casseta & Planeta, Hélio de La Peña, enfatiza o problema das histórias de negros serem contadas pela metade e faz um apelo para a necessidade da representação de personagens e a importância do conhecimento sobre o cinema e nomes inseridos nesse contexto. “A visibilidade agora gera a necessidade de falar. A educação traz reflexos nas ações que queremos ter. O avanço no processo é mais lento do que se desejava, mas se comparado ao passado e perguntando aos seus parentes, vão dizer que estamos avançados”, diz. 

Ao falar em avanço, La Peña ele relembra o branqueamento de figuras históricas, citando o caso de Machado de Assis que é sempre estudado nas escolas mas até pouco tempo o fato dele ser negro era completamente ignorado. “Estou com 60 anos e fui saber que Machado de Assis era negro outro dia. Não falam isso na escola”. Hélio também fala sobre a migração da televisão para outras mídias digitais e afirma que é importante a participação de negros na linha de frente. Por fim, reforça que não se pode comparar países de primeiro mundo como os EUA, pois o avanço do tema têm mais voz — citando como exemplo os canais conduzidos por negros na televisão norte americana como a Black Entertainment Television (BET). 

Chris Pinto traz outro ponto crucial sobre o tema, o papel das marcas nesse espaço: “Tem a ver com a tomada de decisão, pois ela também invade sua casa e fica no inconsciente”. A criadora do Afrogooglers também problematiza o perigo de se contar histórias únicas, o conceito de não estarem descritos em livros e nas histórias, visando apenas um ponto de vista. Ela questiona: “é invasão ou descoberta?” e reforça “existe a necessidade de quebrar paradigmas para desconstruir o ciclo”. 

No fechamento, demonstra estar otimista, com a nova geração e pontua: “A publicidade acaba ajudando a quebrar ou impor estereótipos”. A conversa acaba com sua fala para fazer todos pensarem sobre o racismo. “Se você não está incluindo intencionalmente, você está excluindo mesmo que não intencionalmente. Se você não for uma marca, produtora, canal quebrando estereótipos ativamente, você provavelmente está ajudando a mantê-los e reforçá-los”.

Por Camilla Corrêa, Vitória Nogueira, Bruno Dantas*
*Sob supervisão do professor Kaluan Bernardo