surfistas 1

SURF FEMININO E O EMPODERAMENTO DAS MULHERES

Diversas mulheres se juntaram em grupos para aprender e praticar o surf. Juntas, elas enfrentam desafios como o machismo e a gordofobia

Por: Agatha Menes do Nascimento (1)

Revisão: Felipe da Costa Rico (2)

Edição: Bárbara Rodrigues Nogueira Nakashima (3)

Segundo a Associação Brasileira de Surf Profissional, em 2016, o número de surfistas profissionais homens (por volta de 350) era mais de dez vezes o total de mulheres (32). Isso ocorre porque o esporte sempre teve uma estrutura patriarcal, ou seja, uma maior presença masculina, tanto na gestão, como organização de campeonatos e cargos de liderança, quanto em sua prática, com maior presença de atletas homens.

Consequentemente, o ideal machista prevaleceu, julgando o surf como uma prática masculina, o que restringiu a participação das mulheres ou, até mesmo, impediu o acesso delas. Tendo em vista isso, coletivos de surf feminino têm surgido pelo país com o intuito de agrupar mulheres surfistas para ressignificar a estrutura do surf nacional.

Com o passar dos anos as mulheres começaram a se empoderar e se descobrir no surf, o que permitiu a criação de diversos grupos de surf trip voltados especificamente para esse público.

Pamela Lemos é a criadora do grupo Surferinhas, fundado em 2017, voltado para viagens e aulas de surf para mulheres. “A vontade de criar o grupo veio realmente da necessidade que eu senti de ter mais mulheres na água para compartilhar mais desses momentos, porque é muito difícil você iniciar em um esporte sozinha.” Atualmente, o grupo já realizou 73 viagens dentro do Brasil e várias outras para fora do país.

Já Bruna Bessa, criadora do Maré Alta Trips, fundado em 2018, fez 29 viagens dentro do país e já tem duas internacionais marcadas. O grupo, que já recebeu mais de 260 mulheres, foi criado quando Bessa começou no esporte e sentiu falta de meninas na água. “Eram sempre vários caras e eu me senti até pressionada com isso. Então, montei um grupo no WhatsApp para juntar as meninas que me seguiam e queriam aprender. Foi a partir desse grupo que nós juntamos cada vez mais meninas”, diz Bruna.

Além de ser uma oportunidade de ajudar outras mulheres a iniciar no esporte, os grupos femininos podem ser uma peça fundamental para a sororidade. A psicóloga Ruiara Trindade faz parte do Surferinhas e acredita que a descoberta desse grupo vai muito além: “A descoberta de colegas, de amigas, de mulheres que surfam. Um lugar onde muitas vezes a gente também pode se comunicar.”, diz a psicóloga. Pamela acredita que o surf ajuda não só na prática de atividade física, mas na egrégora feminina: “Uma está dando suporte para a outra e acredito que isso as ajuda a evoluir”.

Mulheres se unem para romper com o machismo presente no surf (Foto: Instagram/Surferinhas – Fotógrafo: Felipe Santos)

O machismo está tão enraizado na sociedade que mesmo no mar, com várias pessoas em volta, alguns homens não se intimidam quando o assunto é preconceito.

A analista de planejamento financeiro e surfista, Patrícia Brambila, vivenciou dois episódios de machismo em alto mar: “uma vez eu estava em São Vicente, fazendo aula de surf, e chegou um surfista gritando: ‘vocês não têm que surfar aqui, vocês têm que surfar lá. Depois vocês se machucam e trazem problemas para a gente, vocês que atrapalham’. Também ocorreu um episódio assim em Maldivas. Fomos para lá surfar e tinha alguns portugueses que entravam em todas as nossas ondas. Eles falaram alguma coisa para os locais porque vieram xingar a gente.”

Sobre as constantes cobranças que as mulheres sofrem, Pamela diz: “muitas e muitas cobranças. Eu digo muitas, porque grande porcentagem das mulheres que chegam já estão com algum problema pessoal ou familiar ou em algum processo de autoconhecimento.”. Além dos problemas pessoais e do machismo, as mulheres também precisam enfrentar a gordofobia em alto mar. Há um imaginário na cabeça das pessoas de que as poucas surfistas existentes são loiras, altas e magras. Porém, quando vamos para a vida real, nos deparamos com mulheres reais, com curvas, estrias e celulites.

Por conta disso, em 2017, surgiu um movimento chamado Curvy Surfer Girl, fundado por Elizabeth Sneed, uma americana que se deparou com a pouquíssima diversidade de biótipos no surf. O projeto de Sneed tem o objetivo de mostrar essa diversidade para as marcas de roupas, fazendo com que elas entendam que precisam estar preparadas para atender todo tipo de corpo.

No Brasil, Bruna Bessa acredita que o peso não é um fator determinante para uma pessoa surfar bem, mas sim o uso de equipamentos adequados para o seu corpo.

OLIMPÍADAS

As Olimpíadas de 2020 foram as primeiras com skate e surfe na competição. Além disso, essa edição também foi importante por contar com a maior presença feminina na história dos jogos (48,8% no total).

Além disso, na estreia do surf, a competição contou com o total de 26 surfistas, sendo que 6 eram mulheres. Ruiara acredita que os Jogos abriram portas tanto para os esportes quanto para a representatividade feminina: “uma forma de saber que as mulheres podem, praticam o esporte, são competitivas e querem concorrer. Além de contribuir bastante para que conheçamos os nomes dos atletas, trazendo inspiração.”.

MINORIAS

As mulheres sofrem muito para serem respeitadas no surf, contudo, elas não são as únicas. Para as pessoas LGBTQIA+, a inserção no mundo do esporte também se torna muito difícil.

O esporte é um recorte da sociedade e por ainda estarmos em uma sociedade machista, gordofóbica e homofóbica, isso é levado não apenas para surf, mas para outros esportes também.

Bessa estava fazendo uma viagem com a Maré Alta Trips e chamou o namorado transexual de uma das alunas para participar. O homem acabou se apaixonando pelo esporte e se sentiu muito confortável em fazer as aulas com as mulheres que participam desse coletivo de surf.

Foi assim que Bruna decidiu fazer uma viagem focada no público LGBTQIA+, para criar um lugar seguro e confortável para eles: “se pararmos para ver, a mídia do surf finge que essas pessoas não existem. É muito difícil ver uma pessoa LGBTQIA+ tendo visibilidade no esporte e, quando tem, sempre falam mal ou julgam.” diz Bruna.

A criadora do grupo pretende expandir seus trabalhos para o grupo LGBTQIA+ e ter patrocínio de algumas marcas para deixar o custo das viagens mais acessível para as pessoas.

“O surf liberta as ondas de uma vida” – Requis Pereira

(1) Aluno do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, estagiário AICOM – repórter

(2) Aluno do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, estagiário AICOM – revisor

(3) Aluna do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, estagiária AICOM – editora

Matéria originalmente produzida para a disciplina Jornalismo Digital em 2022.1