“Coreografias do impossível” é o tema da curadoria e suscita reflexão sobre artes e estratégias desafiantes das impossibilidades
Reportagem: Maria Luisa Ricardo Cavalcante [1]
Supervisão: Prof. Gean Gonçalves [2]
Estudantes da FIAM, do curso de Jornalismo, realizaram, no dia 23 de novembro, uma visita guiada pela 35ª Bienal de Arte de São Paulo, inaugurada em setembro deste ano no Pavilhão Ciccillo Matarazzo, dentro do Parque Ibirapuera. A maior bienal de arte contemporânea do hemisfério sul traz em sua composição 1.100 obras realizadas por 121 artistas em representação a diversos povos, lutas coletivas e suas resistências – as Coreografias do Impossível, tema proposta pela curadoria coletiva.
A visita foi mediada por Gladys Agbanusi, estudante de pedagogia, e Giovana Lira, estudante de letras, que explicaram mais a fundo sobre a proposta da bienal criada pelos quatro curadores: Diane Lima e Hélio Menezes (brasileiros), a portuguesa Grada Kilomba e o espanhol Manuel Borja-Villel.
O primeiro projeto visitado pelos estudantes consiste no inédito fechamento provisório do Vão feito por Oscar Niemeyer através de superfícies curvas. Ideia advinda dos arquitetos Anna Juni, Enk te Winkel e Gustavo Delonero como forma de virar a obra de Niemeyer do avesso, “[…] ato de fagocitar simbolicamente o espaço aberto”, em definição dos criadores.
Outro destaque, já exibido anteriormente na Pinacoteca de São Paulo, é a Parede da Memória feita pela artista Rosana Paulino quando ainda era uma estudante. A obra apresenta um conjunto de 1.500 fotos de pessoas pretas costuradas em “patuás” (amuletos protetores por religiões de matriz africana) como denúncia a invisibilidade de pretos e pretas que não são vistos como indivíduos. Ao colocar mais de 1.500 olhos observando-te, Rosana demonstra que não é mais possível ignorar a presença e o pertencimentos dessas pessoas.
A obra exposta Frente – 3 de fevereiro, de Abigail Campos Leal, também traz a resistência do povo preto ao racismo, na tentativa de viver diante dos acontecimentos nos quais não era para terem sobrevivido, em menção ao assassinato de Flavio Ferreira Sant’Ana, jovem dentista negro falecido em 2004 por policiais militares. Além do uso da trilha sonora “Quem policia a polícia?”, utilizada no trecho do documentário Zumbi somos nós, publicado em 2007, Abigail usufrui da inteligência artificial para copiar digitalmente a poeta, socióloga, ativista e fundadora da Frente Três de Fevereiro (grupo de pesquisa e de ação direta comprometido com a luta antirracista no Brasil), Maurinete Lima, falecida em 2018, uma intelectual negra responsável pelo livro de poesias Sinhá-Rosa.
“A experiência dessa videoinstalação encruzilha passado-presente, vida-morte, revolta-alegria, como um feitiço tecnológico para fazer vingar a vida preta em sua ingovernável performance de ressurreição infinita”, conforme diz Abigail.
A artista balinista, Citra Sasmita, também trouxe em sua obra, Projeto Timur Merah IX: Além do reino dos sentidos, o significado da resistência ao se basear na pintura secular conhecida por “kamasan”, que tinha como um dos objetivos retratar atos heroicos masculinos. Ao entrar na instalação com sua arte há um boneco de cor dourada, sentado, com uma corda amarrada em seu pescoço ligada a uma das pinturas de Citra, um resumo sobre sua arte e sobre a inversão de papéis. Em sua obra, a artista muda o personagem principal dessa história, que agora são mulheres indonésias representadas em tecidos expressando a dor sofrida diante do patriarcado de seu país. As mulheres continuam produzindo vida em seu ventre e até em sua morte, a partir do surgimento de árvores em suas cabeças, numa relação coletiva misturada em constante troca de prazer e dor.
Como visto nas obras citadas anteriormente, a trigésima quinta Bienal possui em seu catálogo a arte como um campo para se dialogar e aprender, ao retratar a superação do impossível a partir do olhar de inúmeros artistas que encontram na complexidade do mundo uma possibilidade de resistência. As dores precisam ser vistas por aqueles que não a compreendem ou não a vivenciaram, para que assim, sejam discutidas e, ao mesmo tempo, sentidas.
[1] Estudante do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM – Estagiária AICOM
[2] Professor do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, supervisor de estágios AICOM