Andrea Naccache, responsável pela primeira auditoria de inteligência artificial em um escritório de direito, veio a FMU falar sobre inteligências artificiais e os impactos existenciais
Texto Ana Carolina de Oliveira Moura [1], áudio e fotografia de Linda Bee [2]
Supervisão: Prof. Gean Gonçalves [3]
Em 11 de outubro, aconteceu a palestra Inteligências artificiais e seus impactos existências, com a participação de Andrea Naccache, que tem formação em direito e psicanálise. Em sua fala, ela contou como essas duas áreas se encontram no momento. Segundo Andrea, transição é o estágio de porta de entrada para um novo mundo e a transação é quando já estamos neste mundo.
Ela iniciou abordando questões transacionais, sobre o nosso acesso ao mundo e como ele vem marcado por ilusões, fantasias e “pulsões”, algo que seria como o impulso/instinto e como a gente acessa o mundo de maneira repetitiva em algum momento. Ela tratou do modo como a imaginação tem grande influência nessa parte de questões transacionais e de como isso faz parte da nossa vida por conta do acesso das coisas que temos durante a vida.
Também foi dado o exemplo da transação no mundo do direito. Nela muitos advogados têm dificuldades, por exemplo, para chegar em termos de contrato, pois as partes já têm suas fantasias, suas buscas e chegar a termos contratuais plausíveis entre as duas partes. Ela comentou que no campo das transações o que nós temos por trás são valores e funções, “qual a função de comer um pote de sorvete quando se está triste na cultura americana?”, “qual é a função de ficar horas na academia?”, no final a gente sempre busca funções para as nossas ações.
Ela também citou o psicanalista e pediatra Donald Winnicott – teórico que estudou a criança e a importância do brincar –, que começou a falar sobre objetos transicionais na década de 1950 e, em 1971, publicou um livro chamado O brincar e a realidade, onde escreveu sobre as relações infantis, como o que determina a criança a brincar, e como é a criação de si, do outro e do mundo para as crianças. Winnicott também aborda o objeto transicional como se fosse parte da própria criança e para quem está de fora é algo comum, como um brinquedo em que ela só consegue dormir se estiver com esse brinquedo.
Andrea citou uma frase de Winnicott: “sem alucinar a criança põe para fora com o brinquedo uma amostra do potencial onírico dela”, explicando que potencial onírico é a nossa capacidade de sonhar e de como a criança não lida com a toda a realidade e sim com fragmentos da realidade.
Também trouxe um exemplo de como fones de ouvidos te levam para trás em questão de socialização, de como ele, em partes, nos isola da sociedade e nos faz voltar a subjetividade interna e como isso é um engajamento transacional que está extremamente acentuado nos recursos de tecnologia. Acrescentou ainda como a tecnologia atualmente nos deixa em lugares cômodos, mas nem sempre saudáveis.
Ela discorreu sobre o espaço transicional com a tecnologia. Naccache usou a palavra “antessala” para falar sobre isso e definir o seguinte exemplo: “o emoji de coração ele não é amor, nem amizade ele é um pré-amor e uma pré-amizade” porque a pessoa não está vivendo a experiência real de encontro com o outro, fica apenas no “pré”, na antessala. O que, na visão da palestrante, acaba por bloquear o caminho para a verdadeira relação, para o compartilhamento real de sentimentos e sensações. “Se a pessoa acaba ficando permanentemente nisso, nas pré-relações, ela pode acabar vivendo sensações de agonia, autoengano e até criando uma compulsão”, esclareceu.
De volta à área jurídica, Andrea abordou a diferença e tratamento de contratos. Segundo a convidada há dois tipos de contratos: os existenciais que são contratos relacionados aos direitos humanos, direitos como sobrevivência, saúde, moradia e educação; e os contratos empresariais que são contratos de pessoas físicas e jurídicas com intenção de lucro. Advogados são agentes na área jurídica com poder de observar e regulamentar os contratos porque em muitos casos existem pessoas que assinam contratos e não sabem onde estão se metendo.
Em seguida, Andrea pediu para a plateia pensar sobre como já estamos vivendo algo parecido com a internet. Para isso, deu como o exemplo o Whatsapp e como é difícil deixar de participar do aplicativo sem que isso afete as relações familiares e de amizade. Para ela as redes sociais podem nos afetar tão profundamente e em diversas áreas da nossa vida. Da mesma maneira, as inteligências artificiais têm o poder de agir e transformar rapidamente as relações das pessoas. “As pessoas entram em uma relação com a inteligência artificial sem saber até onde se está chegando e como isso pode causar uma dependência permanente desses recursos” – o que demanda, na avaliação de Naccache, transações com este universo.
Ao final da palestra, Andrea concluiu com um diagnóstico sobre a auto-exposição feita na Internet, de dados particulares até imagens de intimidade. Ela alertou a todos sobre como essas imagens e dados são adquiridas e usadas por terceiros. Além disso, avaliou os efeitos negativos do digital na saúde das pessoas e como cada vez mais se reflete sobre o tempo gasto em telas.
[1] Estudante do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM – Estagiária AICOM
[2] Estudante do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM – Estagiária AICOM
[3] Professor do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, supervisor de estágios AICOM