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Invasão na Ucrânia e eleições no Brasil trazem as trincheiras para a web em 2022

Por: Bruno Menezes[1];

Edição: Samantha Rubio[2];

*Matéria originalmente produzida para a disciplina Jornalismo Digital em 2022.1

O ano de 2022 começou efervescente no mundo: em fevereiro, a Rússia invadiu a Ucrânia em um conflito que já deixou dezenas de milhares de mortos. E, em um cenário cotidiano em que as fronteiras já foram derrubadas pela internet, não há como ser diferente quando se trata de política.

É o que explica o mestre em história social e professor de relações internacionais da Fundação Santo André, Eliel Cardoso. Segundo ele, as redes sociais e a forma como elas mudaram a maneira de se comunicar interferem diretamente tanto em conflitos mundiais como em questões regionais. Não existe mais política que não leva em conta a democratização da comunicação: “Onde tem política, tem grupos rivais; onde tem grupos rivais na política, haverá divergência de interpretação sobre fatos… divergência sobre a priorização de fatos. A forma como a mensagem é transmitida está diretamente relacionada aos interesses de quem a transmite”, explica.

Eliel completa dizendo que, “na internet, todo mundo tem opinião sobre tudo”. Então, isto explica o porquê que governos totalitários tentam controlar tudo o que chega a seus países, principalmente quando o tema é o próprio Estado. China e Rússia, de acordo com ele, são exemplos claros.

Na Rússia, a tentativa de controle à informação, que já era realidade antes dos conflitos, se intensificou com a invasão à Ucrânia. Segundo Eliel, “o governo russo usa multimeios para fazer propagar a sua versão dos fatos; usa plataformas multimídia que produzem conteúdo que vai para o rádio, que pode ser impresso, que pode ir para a televisão e internet”. Ele completa afirmando que este último é a grande tecnologia da nossa época, marcando uma diferença tecnológica fundamental.

É neste ponto que entram as agências financiadas pelos governos, presentes em todos os lugares. Na Rússia, destacam-se o “Sputnik” e o “Rússia Today”, veículos de comunicação que divulgam informações que beneficiam e justificam as atitudes tomadas pelo governo. Porém, quando comparamos os dois países em conflito, vemos que não são assim tão parecidos.

Coisa que a gente já não vê na Ucrânia. O governo ucraniano precisa criar sua comunicação, precisa comunicar seus objetivos de guerra, explicar justificativas e razões para conquistar apoio, aliados. A Rússia faz isso. Os nazistas também fizeram, com a tecnologia que estava disponível à época. A comunicação é sempre o segredo dos conflitos”, explica o professor.

Antes da democratização do acesso à internet, a grande mídia era a responsável por direcionar as notícias. Hoje, entretanto, é a mesma grande mídia que tenta combater as fake news criadas e propagadas nas redes sociais, beneficiando grupos específicos. É como se tentassem recuperar o monopólio da informação.

Anteriormente, o falecido jornalista brasileiro Millôr Fernandes afirmou que “jornalismo é oposição e que todo resto é armazém de secos e molhados”. É neste sentido que o professor Eliel Cardoso relaciona veículos de comunicação financiados por um governo à propaganda.

No Brasil, não é diferente. O país terá em 2022 a eleição mais polarizada do século, de acordo com o gestor e produtor cultural Rodrigo de Oliveira. Por mais que o presidente Jair Bolsonaro se declare contra os principais meios de comunicação do país, é possível encontrar no rádio e na televisão algumas agências financiadas pelo governo como as que atuam na Rússia.

Em 2018, a eleição de Bolsonaro foi incentivada por diversas fake news espalhadas pelas redes sociais. Para Rodrigo, entretanto, a televisão continua sendo o veículo mais determinante quando se diz respeito a moldar opiniões. Neste ano, ele destaca a Jovem Pan, que se tornou um canal televisivo no ano passado. “Não precisa assistir por muito tempo para ver o direcionamento de informações dessa emissora”, diz. “A comunicação interfere em tudo. É muito poderosa. Tudo que tem de positivo e de negativo nas redes sociais vem do que havia de positivo e negativo em qualquer conversa. Eu acho que as pessoas estão, sim, mais expostas nas comunicações populares porque a gente está exposto a partir do momento em que interage com o outro. Se há uma ética, faz-se da exposição algo cuidadoso, responsável e respeitoso. Se não houver esse princípio da ética, a interferência é grande. Principalmente quando a comunicação está por trás da eleição”, completa.

Rodrigo explica, ainda, que precisa haver uma diferença muito clara entre a militância e a fonte informativa propriamente dita: “a militância atua com paixão. Os caras querem ganhar o Fla x Flu. Agora, quando se trata de um mecanismo institucional, é preciso deixar a paixão de lado. Vou cair na ética novamente: para misturar paixão e informação, é preciso de ética; de compromisso com a verdade”, explica o produtor.

É por este motivo que, há algum tempo, o conteúdo publicado nas redes sociais já vem sofrendo um processo que seria semelhante a um modelo de controle. Espalhar fake news por meio de robôs configura crime cibernético, previsto em lei. Por isso, existem delegacias que os investigam. Sobre isso, Eliel Cardoso comenta: “hoje, há uma percepção maior de que a internet não pode ser uma terra sem lei. A lei alcança a internet. O governo e a lei estão nelas.”

É neste cenário que encontramos as principais conexões dos conflitos mundiais em nosso próprio país. Apesar de o Brasil não estar diretamente envolvido na guerra, é possível sentir e mensurar os impactos que os desastres globais causam em nossa economia, saúde e até mesmo nas relações sociais. Das trincheiras de terra às digitais, a polarização da população foi mais uma vez trazida ao centro do debate, tomando força uma ideologia que começa a se questionar se realmente todos esses debates e discursos de ódio trazem algum benefício ao desenvolvimento do país.

[1] Aluno do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, repórter

[2] Aluna do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, editora