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Estudar história é a ferramenta para entender períodos de guerra e projetar transformações para o futuro

Por: Gabriela Perpétua[1] e Samantha Rubio[2]

Edição: Samantha Rubio

*Matéria originalmente produzida para a disciplina Jornalismo Digital em 2022.1

Estudar e compreender a história pode ser o ponto chave para entender tensões e conflitos como as que envolvem o planeta atualmente. A partir da análise crítica do historiador, podemos acumular conhecimento e construir melhores relações diplomáticas.

Diante dos conflitos que acompanhamos diariamente nos noticiários, é comum surgirem perguntas como: ainda não aprendemos com tudo o que o ser humano já passou? Apesar de termos conhecimento dos desastres que são causados principalmente pelos conflitos armados, ainda os acompanhamos na televisão.

Em 1961, o então presidente dos Estados Unidos, Dwight D. Eisenhower, alertou quanto ao crescimento do poder do complexo industrial militar. Em seu discurso de despedida, intitulado “Razões para a Guerra”, ele ressalta que é necessário manter exércitos, mas, ao mesmo tempo, estar tão dependente da indústria armamentista pode gerar o risco de que, no futuro, seja necessário fazer guerras.

Aprendemos história na escola e neste contato, entendemos que desde a formação da primeira sociedade, existem guerras e conflitos das mais variadas naturezas. Porém, é a atuação do historiador, subsidiado por toda a ciência, que nos permite compreender o porquê vivemos o que vivemos hoje. “Diante de todas essas dificuldades, estes conflitos que impactam nosso dia a dia (…), é na história e nas demais ciências humanas que podemos procurar pelo menos algum alento e compreender de fato porquê e em que condições estamos vivendo e passamos por elas”, afirma o professor do curso de Ciências Sociais do FMU Centro Universitário, Fábio Julião.

A partir da análise de cada fato denominado histórico, o profissional que se dedica a interpretar os acontecimentos pode construir uma teoria, respeitando os limites da ciência. O professor de História do Centro Universitário FMU, André Mendes, explica que a história não julga, ela analisa: “ela consegue analisar o que foi a partir de lentes muito características do tempo presente”.

É dessa forma, a partir das lentes dos historiadores, que podemos projetar gerências e ingerências dos períodos que se passaram, nos fatos que vivemos no futuro. Por este motivo, alguns pesquisadores afirmam que a história serve como subsídio da guerra. “Quanto maior o volume de subsídios e massa crítica que um estado tem em relação aos demais, melhores são suas relações no geral. […] Você alimenta as proximidades, as alianças e eventuais rupturas com governos locais, levando em conta os substratos que você traz consigo, que vem da história, da antropologia, da sociologia(…)”, explica o professor André.

A história que conhecemos

Existe um ditado popular que diz: quem conta um conto aumenta um ponto. Assim também é com a história. Em tempos de guerra, a primeira vítima é a informação.

Embora tentemos provar que a construção da sociedade é baseada na neutralidade da ciência, André Mendes explica: “a ciência não é neutra. Uma guerra como esta que estamos vendo na Ucrânia, ou a Guerra Fria, por exemplo (…), foram subsidiadas pela ciência. (…) O historiador tem que deixar claro que esta é a sua leitura de mundo, amparado em um repertório e uma tradição que me antecedem. E que esta não é a única.”

Durante os conflitos ou acontecimentos de grande relevância, as informações são compartilhadas por fontes que estão engajadas nos fatos, de modo que permite externalizar os pontos que lhes são mais favoráveis. O professor Fábio Julião explica que é importante que os meios de comunicação prezem sempre pela polifonia das narrativas, pois “não podemos adotar uma narrativa em detrimento de outra. Quando temos um processo comunicativo, seja pelas mídias hegemônicas, seja presente nas redes sociais por conta de estereotipias e visões muito calcadas pelo senso comum, teremos um impacto no processo comunicativo”.

Em tempos de conflito, “é possível que os atores históricos reproduzam o que é sabido antes”, destaca André. Com base no conhecimento da história e dos fatos que antecederam a sociedade, os agentes diplomáticos criam a imagem de quem são, usufruindo do controle de massas pela criação de monopólios de comunicação e propiciando discursos que comovem.

Conflitos que nos transformam

Segundo Karl Marx, por mais que os elementos e fatos se pareçam, a história nunca é igual. Em um mundo globalizado, os acontecimentos também são globais. Mais do que conflitos armados, a sociedade vem enfrentado disputas que se travam em meios naturais, cibernéticos e até mesmo guerras de informação.

A guerra não muda elementos culturais, mas este tipo de conflito se mostra uma oportunidade para alguns segmentos. Às vezes a guerra que se trava não é a guerra contra um inimigo nacional (…), é contra um vírus e você traveste isso de guerra”, expõe André.

É notório que a humanidade evoluiu muito durante os períodos de guerra. A medicina só é brilhante como a conhecemos devido às pesquisas que foram realizadas durante a Segunda Guerra Mundial, por exemplo. “As guerras, os conflitos de quaisquer ordens, são potencialmente alavancadores de possibilidades e conhecimentos”, destaca André Mendes. As guerras modernas, como os ataques cibernéticos e a utilização de mercados internacionais, acabam afetando o mundo inteiro de maneira desigual.

Analisando especificamente o conflito atual entre Rússia e Ucrânia, não é possível prever qual será o desfecho. Porém, independente de angariar um estado de paz por meios diplomáticos ou mesmo pelo declínio de um dos estados derrotados, o professor Fábio afirma que “não há dúvidas que há um impacto na maneira pela qual as pessoas passam a olhar o mundo (…). Isso sem falar naquilo que é comum na guerra: faz surgir uma certa solidariedade, um espírito de companheirismo, de ajuda, até de ética, diante das atrocidades que são típicas em qualquer conflito”.

Legado para o futuro

Apesar de não poder prever o futuro, a história nos ensina que os períodos de tensão e conflitos nos deixam um legado, que podem ser impulsionados pela tecnologia.  “Hoje em dia já se cogita a possibilidade de utilização de arma nuclear na Ucrânia. Não como aquelas de Hiroshima e Nagazaki. Armas de pulso eletromagnético, com um potencial destrutivo local absurdo”, ressalta André. As atuações na guerra trazem para o plano estratégico mais do que o uso de drones, mas também a possibilidade de controle de satélites e o aumento de ataques hacker a sistemas computacionais.

Porém, também podemos sentir efeitos a curto e médio prazo, como ressalta Fábio Julião: “em termos de organização política e social, há por exemplo o temor em relação ao desfecho das eleições gerais. Nas relações econômicas, já vemos as preocupações com o grande e contínuo aumento do custo de vida”. Embora não sejam efeitos diretos da guerra, estas questões nos permitem pensar em como nossos governos lidam com os pontos e controlam políticas públicas.

Mais do que consequências físicas, o conflito entre Rússia e Ucrânia está sendo marcado pelas redes sociais e digitais. A cultura do cancelamento espalhou uma visão “russofóbica”, na qual qualquer influência do país é tida como vilã. A partir do momento em que as tendências digitais passam para o mundo real, há duas possibilidades: “ou o mundo digital vai influenciar de tal maneira o real que isto vai se tornar cotidiano, ou o mundo real põe freio no digital. Agora, qual caminho? Eu espero que o primeiro!”, finaliza André.

[1] Aluna do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, repórter

[2] Aluna do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, repórter e editora