Nerd 18-03-22

Perfis comportamentais no universo tecnológico e seu potencial de capitalização

Como o Vale do Silício conseguiu transformar a permanência online em dinheiro

Por: Beatriz Macedo [1]

Professor Supervisor: Wiliam Pianco [2]

Duzentos e vinte três milhões. Esse foi o número de brasileiros atingidos pelo megavazamento de dados ocorrido em janeiro de 2021. O sequestro de dados foi atribuído a um hacker, após sua publicação de CPF´s como uma espécie de amostra grátis, em um fórum online dedicado à comercialização de base de dados. De acordo com informações disponibilizadas pela Apura Cyber Intelligence, empresa de cibersegurança, estima-se que 69 empresas tenham sido alvo de sequestros de dados entre janeiro e julho de 2021.

As principais bases invadidas foram aquelas que continham dados privados de cidadãos, alocados em sites do governo. Isso fez com que as pesquisas sobre identificação de vazamentos atingissem o pico de popularidade de termos buscados no Google no primeiro semestre do ano anterior. Mas se o assunto não são dados bancários ou documentos de identificação, e sim os remédios que você compra quando está doente, ou o número de vezes que você acessa aquele site de moda e cobiça o look perfeito – quando são esses os dados pegos sobre você -, também pode ser considerado uma invasão à privacidade?

Você deve estar se perguntando por que dados tão banais seriam de algum interesse, ou até mesmo como essas informações podem ser encontradas por alguém. Então vamos do começo: rastros de comportamento digital. Estar inserido no universo tecnológico é como criar um perfil comportamental de redes digitais para si mesmo, os famosos cookies – sim, esses mesmo. Respire fundo e não quebre o mouse tentando recusar. Termos de uso se encarregam disso, guardando informações sobre as preferências de navegação de cada usuário, com a justificativa de gerar uma experiência personalizada para cada um, e é aí que chegamos à próxima peça da engrenagem de dados dos mineradores do vale do silício: as predições de compras futuras.

Antes de tudo, é necessário entender que nossos perfis de comportamento são utilizados como matérias-primas – geradas por todos os usuários, basicamente, de graça – de toda a estrutura de anúncios que chegam até nós. Magicamente, após qualquer pesquisa disposta aleatoriamente. O trabalho realizado após a obtenção de dados em grande escala é dispor a cada informação uma possibilidade de acesso. Ou seja, por se basear em seus gostos, reações e tendências, a inteligência de máquina prediz quais as chances de click´s e consumo entre você e os diversos anúncios direcionados existentes, e as empresas por trás desses atos, enfim, colocam os resultados desse processo à venda no mercado.

Nesse ciclo se baseia o conceito de capitalismo de vigilância – os usuários são a essência da produção de uma matéria-prima a zero custo, que é reinvestida e analisada para a criação do principal produto: a suposição de ações futuras, tão assertiva quanto se é possível, para que, no fim, isso seja vendido pela maior oferta. Todo esse sistema é baseado em ações que ultrapassam os limites do direito à privacidade, trazendo à tona discussões sobre medidas que protejam a vontade de escolha sobre o que é compartilhado, com quem e para que fim.

Referências:

O´Neil, Cathy. Algoritmos de destruição em massa: como o big data aumenta a desigualdade e a ameaça à democracia; Cathy O´Neil / tradução por Rafael Abraham. – 1.ed.- Santo André, SP : Editora Rua do Sabão, 2020.

ZUBOFF, Shoshana. A era do capitalismo de vigilância: a luta por um futuro humano na nova fronteira do poder; Shoshana Zuboff / tradução por George Schlesinger – 1.ed. -Rio de Janeiro : Intrínseca, 2020.

[1] Aluna do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, estagiário AICOM.

[2] Professor do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, supervisor de estágios AICOM e coordenador do NERD – Núcleo de Estudos das Redes Digitais.