A pandemia não está gerando só danos físicos, mas prejuízos à saúde mental por conta da quarentena. Por determinação de governadores, a população está sendo mantida em regime domiciliar para que o vírus não se espalhe ainda mais e, com isso, cause um verdadeiro colapso em hospitais, que não conseguirão atender a demanda de infectados simultaneamente.
O simples fato de ficar em casa por tempo integral pode mexer e muito com o nosso psicológico. É preciso exercitar não apenas o corpo, mas também a mente para que não sejam desenvolvidos traumas e desgastes emocionais. Alguns exercícios práticos ajudam nesse processo, como a leitura, não acompanhar todas as notícias sobre a doença, colocar uma música que goste, conversar com algum amigo por telefone ou chamada de vídeo, ver um filme, entre outras atividades que podem fazer toda a diferença para manter a sanidade mental.
Como cuidar da saúde mental em tempos de quarentena?
Devido a pandemia em que estamos vivendo, as consequências do isolamento social começam a surgir, afetando consideravelmente nossa saúde mental. A ansiedade, o estresse e o medo aumentam gradativamente. Por isso, é fundamental encontrar meios para lidar com nosso estado emocional. Uma dica importante é estabelecer uma rotina, praticar atividades que proporcionem bem estar, ler, meditar, se exercitar, ouvir músicas, assistir filmes e séries. Procure fazer terapia online, essa pode ser uma porta de entrada para elaborar melhor as mudanças que estamos vivendo, além de ser uma boa forma de trabalhar seus medos, conflitos e conhecer melhor a si mesmo.
O que podemos esperar e como sobreviver não apenas ao vírus, mas a esse enclausuramento forçado?
No dia a dia nós costumamos definir uma rotina, fazemos planos, metas na vã tentativa de exercer controle sobre nossas vidas, no entanto, a falta dele (controle) nos impossibilita de prever o que está por vir e o que esperar. A incerteza de um futuro indefinido gera muita ansiedade. Por isso, lembre-se de fazer o que está dentro do seu controle. Evite aglomerações, utilize máscara, álcool em gel, tome os devidos cuidados com a higiene da sua casa, faça o que está ao seu alcance. Em relação ao isolamento, é essencial lembrar que ele é social e não emocional. Mantenha sempre o contato com as pessoas que você ama, use a tecnologia a seu favor.
A quarentena nos deixou mais conectados em decorrência da quantidade de lives atualmente. Mas, como isso impacta a saúde mental? E o que uma sobrecarga de notícias (ou mesmo as informações falsas) podem acarretar?
As lives são uma boa forma de conectar pessoas e gerar entretenimento. É necessário cuidado ao acompanhar o que está sendo veiculado nas mídias, redes sociais e buscar fontes confiáveis para informação. É importante acompanhar o desenvolvimento da pandemia, no entanto, busque saber apenas o que for preciso. Não é necessário acompanhar notícias, vídeos que mostram vítimas fatais, enterros, familiares desolados. Pelo contrário, evite qualquer tipo de conteúdo mórbido, pois isso pode servir como gatilho para desencadear sintomas como, ansiedade, pânico e depressão.
Tem algum exercício mental que possamos fazer para nos mantermos equilibrados diante de tantas informações sobre a pandemia?
Existem exercícios de respiração que podem ser feitos para promover relaxamento, como inspirar profundamente por 5 segundos e expirar da mesma forma; alongamentos e meditação também são bem vindos, sendo aliados importantes para combater a ansiedade. Existem diversos aplicativos e vídeos na internet com conteúdo relacionado à prática da meditação guiada, vale a pena tentar.
Muitas pessoas estão tomando medicamentos para relaxar, como soníferos e calmantes. Nesta época isso é o correto a se fazer?
Qualquer medicação não deve ser administrada sem antes consultar um psicólogo ou psiquiatra. Muitas pessoas confundem estar ansioso ou estar deprimido com ter, de fato, um transtorno de ansiedade ou depressão. Esse diagnóstico só é possível a partir de uma avaliação psicológica. Por isso, o ideal seria marcar uma consulta e esclarecer suas dúvidas com um profissional e em hipótese alguma se automedicar.
Para os jovens, é mais fácil lidar com o distanciamento pessoal por já estarem mais conectados pela internet?
Certamente para os jovens é mais fácil se manter conectado, apesar do isolamento, devido a familiaridade que possuem com as redes sociais. Porém, é importante lembrar que diversas informações são disseminadas pela internet. Não é fácil lidar com o bombardeio de informações, muito menos com a sensação de medo e impotência diante dos fatos, com a limitação à liberdade. Ou seja, estamos todos no mesmo barco, é uma situação desoladora para todos.
De que forma o isolamento social pode afetar os idosos que já vivem sozinhos? E como lidar com essas sensações?
A saúde mental dos idosos merece cautela e muita atenção, primeiramente os idosos já carregam a percepção da finitude, ou seja, começam a refletir sobre suas limitações, o tempo que lhe resta, sua fragilidade diante da vida. Com a evolução da pandemia, o risco se torna real, o número de mortes na terceira idade é elevado e tudo isso tem causado pânico e muita insegurança. Sendo assim, o papel dos familiares e amigos é muito importante, pois devem manter o contato diário (evitando a sensação de abandono), esclarecendo dúvidas e orientando corretamente.
Esse momento que estamos vivendo pode acarretar traumas psicológicos futuros pós-pandemia?
Sim. Não apenas a pandemia, mas as consequências que estão por vir. O processo de luto, as perdas pessoais, o desemprego e os impactos na economia do país podem trazer danos severos à saúde mental, como transtornos de ansiedade, pânico, depressão e TEPT (transtorno do estresse pós-traumático). Não passe por isso sozinho, procure um profissional da saúde.
O Brasil possui elevados números de depressão e ansiedade. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) 5,8% dos brasileiros (cerca de 12 milhões de pessoas) sofrem de depressão. Esse é o maior número da América Latina, perdendo apenas para os Estados Unidos. Devido ao excepcional cenário mundial que o coronavírus está deixando, campanhas sobre a importância da saúde mental em tempos de quarentena e isolamento social estão vigorando nas redes sociais. Muitos profissionais continuam a consultar seus pacientes de forma online – vídeo, mensagem, ligação – e começaram a atender pessoas que não faziam terapia antes, mas devido ao isolamento e os conflitantes sentimentos que ele traz, buscarem ajuda profissional médica.
É o caso da estudante de terapia ocupacional, Victória Maria Ferreira dos Santos, 20 anos, que trabalha como estagiária em um colégio particular na cidade de Sorocaba, acompanhando um aluno autista. Victória faz terapia online há um ano e meio, sendo metade desse período no qual a maior parte está sendo feito online, quando perguntada qual a motivação para procurar a terapia, ela comenta: “em 2017 eu procurei o “plantão” (nome dado para consultas realizadas por estudantes de psicologia no campus da faculdade), por conta da pressão do dia-dia mesmo e pressões internas. Depois que você passa no “plantão”, você automaticamente passa para a lista de espera, para que receba um atendimento contínuo.”
Victória também conta que os atendimentos estão sendo feitos via WhatsApp e que gostaria que voltassem a ser presenciais assim que a pandemia passasse e relata: “no meio dela (pandemia) eu tive um episódio e acabei mandando uma mensagem para ela com assuntos que estávamos debatendo no começo do ano. Assim, ela combinou de ficar conversando comigo.”
Dentre as dificuldades presentes no atendimento online completa: “Às vezes o sentimento vem e eu escrevo para ela e ela só consegue me responder quando tem um horário disponível, mas isso faz com que se torne uma “conversa diária” e isso é muito bom.”
Idosos se reconectam
Os idosos estão no grupo de risco. E devido ao isolamento social muitos deles precisaram parar de realizar as mais diversas atividades diárias. Com isso, e pela questão da saúde mental durante a quarentena se faz necessário o debate dos impactos causados pelo isolamento. A cidade de Boituva está localizada no Estado de São Paulo e possui uma população de 60 mil habitantes. Considerada uma cidade boa de se viver, muitos idosos oriundos da capital mudam-se para a cidade a fim ter mais tranquilidade e qualidade de vida. Por isso, a cidade possui políticas especiais para essa população, uma delas é o Núcleo da Terceira Idade (NUTI), um centro de convivência social onde são oferecidos cursos de pintura, bordado, atividades físicas e jogos, além promover bailes ocasionalmente.
Nesta conjuntura, há histórias como a de João Ferreira, de 73 anos, aposentado desde 1995, e Maria José Leite dos Santos, de 67 anos, ambos habitantes da cidade de Boituva. Ao serem indagados sobre as atividades que exerciam antes do isolamento social, responderam:
Dona Maria: Antes eu fazia de tudo. Ia na “terceira idade” (NUTI), fazia exercício. Ah, fazia de tudo aquilo que podia fazer… caminhada… Ah, essas coisas assim que a gente faz no dia-dia.
Seu João: Eu também ia na “terceira idade”, fazia exercício físicos, fazia caminhada. Também “batia perna” na praça, gostava de caminhar pela cidade, ir à praça conversar com os amigos e agora eu “tô” isolado.
Como tem se sentindo emocionalmente neste 1 mês de quarentena:
Maria: Ah, “tá” bem chato, porque a gente fica em casa. Se bem que a gente ainda “tá” saindo “pra” fazer as coisas necessárias: compras, pagar prestações, ir ao banco… essas coisas.
João: Eu me sinto totalmente isolado, como se eu tivesse numa jaula (risos). Só não me sinto porque eu ainda saio para ir à minha chácara tratar das minhas galinhas, senão eu ia ficar muito triste.
Sobre o que estão fazendo para passar o tempo/se distrair:
Maria: Estou cozinhando para as pessoas que estão junto de “mim” (risos). Continuo limpando, lavando, mas, entre uma coisa e outra, faço uma receita para distrair.
João: Eu “tô” assistindo as notícias dos jornais e orando muito, pedindo a Deus para a saúde da humanidade.
E do que mais sentem falta de fazer?
Maria: Ah de não estar frequentando a “terceira idade” porque lá eu fazia os exercícios, que era muito bom “pra” gente. Aqui em casa a gente faz uma “coisinha”, mas é muito pouco. Lá, a gente fazia exercício de braços, pernas, de corpo e várias coisas.
João: O que mais eu “tô” sentindo falta é de não “tá” podendo ir à igreja para fazer minha comunhão espiritual e estar junto com os amigos da comunidade para os encontros dominicais.
Já Ana Carolina dos Santos Silva, de 21 anos, se identifica melhor com as questões abordadas. Estudante de psicologia do 7º semestre conta que não foi muito afetada pela quarentena por já não acompanhar a maioria das lives atualmente, mas reconhece o engajamento que existe nas redes. “Porém, percebi uma maior dependência de plataformas para séries e filmes, principalmente para aliviar a ociosidade e sintomas ansiosos, como falta de sono, irritabilidade, mudança no apetite entre vários outros.”
Recentes estudos mostram que o consumo de internet aumentou consideravelmente, sobretudo entre os jovens, tanto para entreter-se como para informar-se. Devido ao isolamento social, Ana Carolina faz ressalvas aos adultos que precisam manter seus empregos e saem diariamente, dessa forma amenizando o estresse de ficar em casa e faz um extenso relato do que pensa: “Acredito que para os jovens têm sido ainda mais difícil seguir o isolamento social, (…), pois o jovem sempre tem o pensamento de estar imune, além de com todas as lives é tentador juntar os amigos para verem juntos. Para pessoas com histórico depressivo, a longo prazo provavelmente esse quadro pode ser agravado, (…). Já para pessoas mais extrovertidos, pode ocasionar uma angústia abrindo portas para transtornos ansiosos e depressivos.”
Dentre as consequências ao acesso de tantas informações jaz o fato de as Fake News também marcarem presença durante esta pandemia, e sendo as informações verdadeiras, falsas ou até mesmo por memes, esse excesso de notícias acaba que intensificando as preocupações, podendo desencadear sintomas mais severos quanto as crises psicológicas. “E ainda, pessoas que não nunca apresentaram sintomas psicológicos começam a desenvolver fobias ou desassossego diante das matérias acessadas.”
Ela argumenta que a quarentena trouxe perspectivas boas e ruins ao falar da proximidade entre pais e filhos, assim fortalecendo os laços familiares e dedicação às tarefas que estavam pendentes. Mas faz uma importante e expressiva observação: “O isolamento também se torna mais propenso à violência doméstica, suicídios e ataques de pânico, pois presos em casa com seus agressores, mulheres correm mais riscos de serem violentadas e estupradas por seus companheiros. As pessoas depressivas acabam por ativar gatilhos como o afastamento de amigos e a interação que o distraia dos problemas mentais”